Pular para o conteúdo principal

Considerações acerca do Capitalismo através do consumismo no Natal.

Há poucos dias atrás, ao sair do mercado, cheio de sacolas e um pouco atrapalhado, notei que ao lado do supermercado, onde estava uma lata de lixo, lixo oriundo do próprio mercado, estava uma senhora muito debilitada, mal vestida e com a aparência de quem não se alimentou de forma correta, mas que apesar de toda a sua debilidade, ainda tinha forças para catar algum resto ou resquício de comida, papelão ou qualquer outra coisa que lhe renda
dinheiro ou mate sua fome por uns instantes. No meio de toda a correria daquele dia, que para mim já estava exaustivo, foi só o tempo de eu entrar no mercado e sair rapidamente, para aquela senhora sumir de repente.

Ver tal cena me remeteu a uma realidade dura, muito discutida em plenários e muito discutida em congressos nacionais e internacionais, mas sempre discutidas por engravatados, por pessoas que após o debate, terão comida e terão água gelada, gente que não sente na pele.

Foi terrível a sensação que tive ao sair do mercado, cheio de sacolas e ver aquela senhora levantar a cabeça e olhar de forma tão acanhada para as sacolas, como se aquilo fosse a salvadora da sua realidade. Me senti como um corrupto, que no meio tem
po de tentar fazer alguma coisa por aquela senhora, ela ter ido embora, pela sua pressa, pela sua realidade dura.

Toda a situação me revigorou para vir aqui e escrever um post sobre a imposição que sofremos no Natal, Natal que convenhamos, já não existe mais, uma vez que Natal é uma data de cunho religioso, ninguém mais vai à igreja e ninguém mais o celebra com o seu espírito primitivo de amor, paz e compaixão.

Partindo para uma análise mais concreta da atual corrosão do capitalismo na sociedade, através do consumismo, considerado o mau do século, aliás, desse século e da metade do passado, devemos analisar três momentos importantes da história do capitalismo, onde ambos, em datas tão distantes, contribuíram para o atual estado de desigualdade.

O primeiro momento se dá nos primórdios do capitalismo, na era feudal da Baixa Idade Média, na qual dentro dos feudos, se desenvolveu um sistema de “rebaixamento”, onde uns trabalham e outros governam ou o termo muito usado na história “uns trabalham, outros oram e outros governam”. Essa situação dentro do feudo “Estado-Igreja-Trabalhadores”, viria a culminar a e a brigarem ente si durante a Revolução Industrial Inglesa, que viria a confirmar todo o status social desde a era do Mercantilismo e reafirmar o capitalismo como o dono do mundo, pois a então burguesia brigou com a Igreja, que era “contra” os seus preceitos, a classe trabalhadora, como sempre, continuou trabalhando.

O segundo momento a ser analisado, é o pós-revoluções na Europa, se é que esse curto período realmente existiu, quando após as revoluções de 1848 ocorreu o passageiro esquecimento dos ideais revolucionários franceses, mas não o do seu legado, que veio a gerar a fase de “estabilidade”, onde o capitalismo cresceu se fortaleceu ao máximo e somente às vezes demonstrava as falhas inerentes que resultariam na crise de 1929. Nessa fase, novamente, os trabalhadores continuam trabalhando, talvez com mais direitos, aqueles alcançados alguns anos após a Revolução Industrial, como as jornadas de trabalho, mas as desigualdades continuam.

O momento talvez mais importante e mais próximo de nós é o pós-guerra da Segunda Guerra Mundial, a segunda fase do “estado de bem-estar”, onde surgiria a Coca-cola, as propagandas “vintage” que até hoje nos impressionam pela estabilidade passada nessa arte: “mulheres de maiô, carros e bebidas”, a era da caneta e claro, das primeiras representações de São Nicolau (se é que hoje alguém se lembra que esse é o verdadeiro Papai Noel, São Nicolau deve estar esquecido nos templos de Roma), retirado da fantasiosa Lapônia e levado para a América e então espalhado por todo o mundo como o bom velhinho de vermelho. Foi nesse pós- Guerra que se iniciou a corrupta sociedade consumista atual.

Mas ninguém quer falar de pobreza do Natal, aliás, essa é a época do bom velhinho, que só leva presente para as crianças ricas ou as pobres de classe média. A pobreza e a desigualdade são gritantes nessa época do ano, onde as lojas apelam para o sentimentalismo das músicas e das personificações natalinas, mas só compra quem tem dinheiro, quem não tem, se endivida ou passa longe da vitrine.

A pobreza é crônica não só no Brasil, mas no mundo. Estado empurra para o Governo, o Governo devolve para os estados, os estados repetem a estratégia e então o Governo lança a “batata quente” para a ONU e os seus órgãos que hoje são muitos, mas que ainda são dignos de certa confiança.

Fato é que agora os Congressos se fecham, as Assembléias se fecham, os Parlamentos se fecham, os órgãos se fecham, o Mundo se fecha e os corações se fecham, todos vão celebrar o Natal mediante um longo feriado, mas não se esqueçam, no ano que vem tem mais pobreza, tem mais discussão e no meio de tanto fechamento, os pobres esperam decisões governamentais, mas esperam de barriga vazia.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Resenha: A Era do Capital, de Eric Hobsbawm

A era do capital é o segundo volume da aclamada trilogia do historiador britânico Eric Hobsbawm, tendo ainda o livro Era dos Extremos sobre o século XX. Não é o primeiro livro do Hobsbawm que leio, portanto, não se trata aqui de um primeiro contato. Uma característica que é notável em todos os livros que li e acredito que seja algo inerente à sua forma de narrar os fatos é o escopo. Hobsbawm consegue fazer com primazia aquilo que é totalmente pertencente à história e que é o dever de todo bom estudante de humanas: a capacidade de relacionar. O autor estabelece linhas diretas e verídicas entre fatos que acontecem na Europa e que ecoam no resto do mundo. Essa capacidade de escopo parece se tornar mais afiada a cada volume da trilogia, o que não quer dizer que em determinado livro ele se torna mais ou menos crítico. Tentando fugir um pouco dos elogios (que alguns teimam dizer em demasia) atribuídos a esse autor (com toda a razão, em minha opinião), ele ainda não “peca” em ideolog

Resenha: Era dos Extremos, O breve século XX 1917-1991, de Eric Hobsbawm.

Comecei essa leitura no início de Dezembro e entre recaídas  (o livro se torna pesado às vezes, e entusiasmos) terminei a obra com um bom entendimento. Nessa que foi uma das suas consagrações, Eric Hobsbawm nos apresenta o Breve Século XX, com a máxima histórica (e vantagem), de ser escrito por um indivíduo que viveu o mesmo. Eric Hobsbawm detalha os fatos mais importantes, personagens consagrados, teorias econômicas e políticas divergentes de uma forma escopa, com riqueza de análise e profundidade nas suas teorias. Os fatos são analisados a partir da Revolução Bolchevique de 1917 e se encerra com o fim da União Soviética, em 1991. As análises dos fatos são feitas em várias frentes, são analisados não somente de forma política, mas também econômica e os impactos produzidos na sociedade, dando a obra todos os conceitos fundamentais da história. Muitas análises são requintadas por notas de rodapé do próprio autor nos contando da sua vida pessoal no determinado momento em

O Idiota (romance em quatro partes), de Fiódor Dostoiévski TERCEIRA PARTE

 "Quem festim é esse, que grande e sempiterna festa é essa que não tem fim e que há muito o vem arrastando, sempre, desde a infância, e à qual ele não encontra meio de juntar-se. Toda manhã nasce o mesmo sol claro; toda manhã há arco-íris na cachoeira; toda tarde a montanha nevada, a mais alta de lá, ao longe, nos confins do céu, arde em uma chama purpúrea (...). E tudo tem o seu caminho, só ele não sabe de nada, não compreende nada, nem as pessoas, nem os sons, é estranho a tudo e é um aborto. Oh, ele, é claro, não pôde falar naquele momento com essas palavras e externar a sua pergunta, atormentava-se de forma surda e muda; mas agora lhe parecia que dissera tudo isso e naquela ocasião (...). Ele estava certo disso e, sabe-se lá, seu coração batia movido por esse pensamento..."                                                Dostoiévski aponta uma lembrança do príncipe Michkím do tempo em que estava se tratando na Suíça. A lembrança foi provocada pela leitura do desconcer