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Quem é Madame Bovary?

O livro Madame Bovary foi publicado na França no ano de 1856. Em meio a uma sociedade altamente tradicional e aristocrática (mas já com uma longa experiência revolucionária), causou indignação pela análise profunda e verídica dos sentimentos humanos feita pelo seu autor, Gustave Flaubert.

Um fato curioso sobre a obra é que Gustave Flaubert foi a julgamento por crime contra a moral. Durante a apuração do caso, o advogado da acusação lhe perguntou “Mas Sr. Flaubert, quem é Madame Bovary?” e todos pasmaram diante da resposta “Eu sou Madame Bovary”.

A verdade é que todos nós somos Bovarys. Em primeiro lugar, somo como Madame Bovary na aparência, não necessariamente calmos, mas possuímos uma aparência responsável pela nossa imagem sociável e também, como Bovary, possuímos os nossos desejos, os mesmo “torpes” (as aspas fazem respeito a moral e aos bons costumes) e insaciáveis.

Bovary era acima de tudo humana. Uma mulher do campo, cheia de desejos e conceitos idealizados. Seu sonho, fazer um bom casamento configura a vontade geral da sociedade da época. Mas como é digno dos seres da raça humana, uma vez provando a liberdade não economiza esforços em alcançá-la por completo. Casa-se, tem uma filha, mas lhe era preciso mais emoções do que a simples posição de mãe e esposa poderia dar.

Bovary então amou com intensidade e ainda por cima confiou o seu extremado (e incontrolável) amor a homens que não lhe votavam o mínimo sentimento, mas puro desejo, como o autor mostra de forma impactante no fim do livro.

A personagem de Flaubert é instável. Se alterna entre zelos intencionados ao marido e discrição nos seus encontros, mas a prova máxima da instabilidade da personagem se dá no seu ato final, quando é incapaz de se manter dentro de si mesma e encontra uma forma eterna (e heróica) de se livrar da vergonha pública e das dívidas.

Bovary não é um caso isolado. Representa um momento de ruptura com o tradicional, onde a mulher passa a ser vista como um ser de sentimentos, de desejos, sendo eles torpes ou não, mas que por serem desejos, merecem ser ansiados. É a partir da obra de Flaubert que a sociedade inicia um processo que se prolonga até hoje, onde o papel da mulher como aparato tradicional é questionado de forma crítica.

De uma forma geral, Bovary é a mulher mais romântica do movimento realista mundial. A personagem mantém todas as características romanescas, porém agora ela é real e representava realmente a condição das mulheres.

A personagem não pode ser culpada. Não pode ser julgada por ter tido sentimentos e por ter feito uma coisa que era extremamente proibido as mulheres da época fazer, expressá-los.

Corrigindo conforme a minha opinião: “Quem é Madame Bovary?”. “A humanidade é Madame Bovary”.

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